sábado, 18 de maio de 2013

Sermão sobre a tentação de Nosso Senhor no deserto


São Leão MAGNO

O sermão que transcrevemos, de autoria de São Leão Magno, refere-se à quaresma, “época do ano, quando nossos pérfidos inimigos redobram também a astúcia de suas manobras”, como diz o Santo. No entanto, entendemos oportuna sua publicação, sobretudo nesses tempos de resfriamento, quando não de abandono da vida espiritual decorrente do avanço, parece já evidente, sobre as nações do mysterium iniquitatis de que fala São Paulo na II Epístola aos Tessalonicenses.



Há muitas batalhas dentro de nós: a carne contra o espírito, o espírito contra a carne. Se, na luta, são os desejos que prevalecem, o espírito será vergonhosamente rebaixado de sua dignidade própria e isto será uma grande infelicidade, de rei que deveria ser, torna-se escravo. Se, ao contrário, o espírito se submete ao seu Senhor, põe sua alegria naquilo que vem do céu, despreza os atrativos das volúpias terrestres e impede o pecado de reinar sobre o seu corpo mortal, a razão manterá o cetro que é devido de pleno direito, nenhuma ilusão dos maus espíritos poderá derrubar seus muros; porque o homem só tem paz verdadeira e a verdadeira liberdade quando a carne é regida pelo espírito, seu juiz, e o espírito governado por Deus, seu mestre. É, sem dúvida, uma preparação que deve ser feita em todos os tempos: impedir, por uma vigilância constante, a aproximação dos espertísimos inimigos.
[...]
Então preparemos nossa alma para o combate das tentações e saibamos que quanto mais zelosos formos por nossa salvação, mais violentamente seremos atacados por nossos adversários. Mas aquele que habita em nós é mais forte que aquele que está contra nós. Nossa força vem d’Aquele em que pomos nossa confiança. Pois se o Senhor se deixou tentar pelo tentador foi para que tivéssemos com a força de seu socorro o ensinamento de seu exemplo. Acabas-te de ouvi-lo. Ele venceu seu adversário com as palavras da lei, não pelo poder de sua força: a honra devida a sua humanidade será maior, maior também a punição de seu adversário se Ele triunfa sobre o inimigo do gênero humano não como Deus, mas como homem. Assim, Ele combateu para que combatêssemos como Ele; Ele venceu para que também nós vencêssemos da mesma forma. Pois, meus caríssimos irmãos, não há atos de virtude sem uma batalha. A vida se passa no meio das emboscadas, no meio dos combates. Se não quisermos ser surpreendidos, é preciso vigiar; se quisermos vencer, é preciso lutar. Eis porque Salomão, que era sábio, diz: Meu filho, quando entras para o serviço do Senhor, prepara a tua alma para a tentação (Eclo. 2,1). Cheio da sabedoria de Deus, sabia que não há fervor sem combate laborioso; prevendo o perigo desses combates, anunciou-os de antemão para que, advertidos dos ataques do tentador, estivéssemos preparados para aparar seus golpes.

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